Descendente de espanhóis e italianos, Gilberto nasceu em Botucatu, onde passou a infância e formou-se como professor primário. Aos 18 anos, foi convidado a trabalhar na Editora Abril em São Paulo e em 1963 ingressou na USP para estudar Ciências Sociais no período vespertino, enquanto no período matutino e noturno ele lecionava. Em 1971, foi convidado por uma colega para substituí-la como professor no IMES, atual USCS; também trabalhou como sociólogo e na secretaria da Cultura do Estado de São Paulo como diretor de recursos humanos. |
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Pergunta:
Professor, eu queria que você começasse falando nome completo, local e data de nascimento, por favor.
Resposta:
Gilberto da Silva Alves, nasci em Botucatu, em 14 de março de 1943.
Pergunta:
Professor, vamos começar então falando um pouco sobre as suas lembranças da família e da infância. O senhor morou em Botucatu mesmo, como que foi esse início de vida?
Resposta:
A minha infância toda foi na cidade de Botucatu, com a família de descendência dupla, uma parte espanhola e uma parte italiana. Meus avós, obviamente dentro dessa separação vieram para a área de construção civil da parte italiana e a área de agricultura na parte espanhola. Toda a minha infância foi em Botucatu, onde fiz escola pública de excelente nível naquela época e, após a minha formação como professor primário, vim para São Paulo para fazer faculdade e, ao mesmo tempo, estudar... desculpe, fazer faculdade e trabalhar.
Pergunta:
Professor, tem algo que você possa recordar aí desse início como professor primário, dessa experiência em sala de aula ainda em Botucatu?
Resposta:
Na verdade, eu me formei em Botucatu e não exerci lá nenhuma atividade pela minha formação. Eu só vim exercer aqui em São Paulo, depois de dois anos aqui. Naquela oportunidade, era relativamente fácil você obter um emprego, você era procurado. Eu tive uma opção de fazer, fiz uma escolha, com 18 anos fui chamado para trabalhar na Volkswagen ou na editora Abril, e optei pela editora Abril, onde fiquei lá um certo tempo, até que eu entrasse na universidade de São Paulo, na USP, para fazer Ciências Sociais, e isso eu fazia na parte vespertina, e lecionava na parte matutina e à noite.
Pergunta:
Como foi a escolha pelo curso de Ciências Sociais, professor?
Resposta:
Ciências Sociais...eu sempre tive uma tendência para essa área de entendimento, ou mesmo de procura de caminhos. Mesmo quando eu tinha 18 anos, talvez por influência da minha mãe que era muito ativa nessa parte social na cidade de Botucatu, isso me chamou a atenção e o curso de Ciências Sociais eu vi como um caminho que possibilitasse uma atuação nessa área, o que efetivamente veio a ocorrer depois trabalhando como sociólogo realmente.
Pergunta:
O senhor entrou na faculdade em que ano?
Resposta:
Eu entrei na faculdade em 1963 e, como todo aluno, eu vim de uma juventude universitária católica, passei para, naquela época, na parte dos mais radicais, tive alguns problemas que foram sanados durante o período da Ditadura, mas esses problemas, felizmente, não resultaram em grandes danos, mas realmente o ambiente era muito difícil, muito tenso e, enfim, havia um abalo psicológico e social naquela oportunidade. As minhas atividades foram especialmente políticas. Como estudante, elas foram, num arco de opções bastante grande, porque eu não me satisfazia com situações que vinham de encontro à minha formação. Por exemplo, palavras de ordem que não tinham nada a ver com a nossa realidade, e eu fui mudando a realidade de facções porque não via saída, não encontrava em nenhuma delas identificação com as minhas aspirações, mesmo como sociólogo [5'].
Pergunta:
Como se dá esse primeiro contato com a USCS?
Resposta:
Com a USCS eu lecionava, fazia a universidade, já tinha terminado o curso de Ciências Sociais, fazia pós-graduação e aí eu tive um convite para substituir uma professora que era minha colega na Universidade de São Paulo e que, infelizmente, naquela época, ela teve que sair do país até em decorrência da situação política, e ela fez uma indicação para que eu a substituísse aqui para as aulas de Sociologia, voltadas para o curso de Ciências Sociais que existia na época aqui no IMES, no então IMES. Então, eu vim aqui para substituí-la, isso foi em 1971 e daqui nunca mais saí. São 42 anos.
Pergunta:
Professor, como que era esse curso de Ciências Políticas e Sociais da USCS, era um momento de efervescência, a USCS foi criada em 1968 o ano do AI-5, o queria que você falasse um pouquinho dessa efervescência na USP, se ela ocorria aqui também aqui?
Resposta:
Olha, ocorria de forma diferenciada. A USP era sempre um centro de emissão de ideias ou de efervescência política, quer seja pelas características da universidade, seja pela forma como ela era vista pelos militares. Naquela época eu estudava na Maria Antônia, que era bastante efervescente. Aqui no IMES, então como universidade, havia uma diferença porque os alunos tinham outras características, o curso de Ciências Sociais era relativamente pequeno, não havia talvez um contingente, ou que pudesse formar uma massa crítica para ter uma efetivação política maior, embora houvesse uma consciência bastante clara do momento em que nós vivíamos, mas sem que isso resultasse em atividades, ou sem que isso resultasse em manifestações políticas, ou coisa do gênero. Havia o outro lado da questão, eu dava aula de Sociologia, no curso de Ciências Sociais, e também dava aula de Sociologia para o curso de Sociologia Aplicada à Administração para os alunos de Administração, e quando você falava de alguns temas, a abordagem sociológica era uma abordagem tradicional, puramente acadêmica, havia alunos que se indispunham com o tema, com os temas sociais. Eram alunos que apoiavam a revolução, apoiavam a Ditadura, e havia até o medo entre os alunos e entre os professores de agentes infiltrados na época, o que criava uma certa tensão nessas aulas, especialmente as de Sociologia. Então, você tinha que ter uma postura como professor, sem deixar de ser crítico, mas ao mesmo tempo tomando ciência de que aquilo poderia eventualmente resultar em alguma coisa negativa, e evitar isso tendo uma postura acadêmica. Quando se fala de Sociologia, você não pode evitar Mannheim, você não pode evitar Marx, você não pode evitar Aron, enfim, autores que são fundamentais no pensamento sociológico. Mas isso causava, em algumas situações, alguns problemas com a interpretação desses alunos, que sempre achavam que havia uma visão predominantemente marxista, o que na verdade não ocorria, não era isso [10'].
Pergunta:
O senhor se recorda de algum desses momentos de tensão, o senhor enfrentou algum problema?
Resposta:
Enfrentei em classe, problemas desse tipo, de aluno contestando, de uma forma até pueril, sem argumentação, sem nada que pudesse levá-lo a transformar o seu protesto em alguma coisa, era uma questão de ter paciência e explicar, enfim, devolver as ideias com ideias de grandes filósofos ou grandes sociólogos. Mas tive sim problemas em classe de contestação de alguma coisa que se falava, que se falava com base fundamentalmente nos grandes autores. É que havia uma disposição de algumas pessoas, infelizmente, que eram conduzidas de uma forma, muito provavelmente pré-estabelecida para marcar presença como gente que entendia que a revolução, a ditadura realmente estivesse presente aqui no meio acadêmico.
Pergunta:
Como era a USCS, o então IMES, em 1971?
Resposta:
Era... há dois aspectos aí: o primeiro com relação aos alunos, com relação ao corpo discente, que era muito voltado, exceto o pessoal de Ciências Sociais, que tinha uma visão um pouco mais crítica, mas que mesmo assim era uma visão comedida, sem uma atuação efetiva politicamente, pelo menos com o que eu saiba, mas os alunos eram muito voltados para uma formação fundamentalmente técnica, muito técnica, procurando... conhecimentos que o levassem a uma melhor condição de vida, a um melhor emprego e, por outro lado, o corpo docente e também o corpo técnico operacional do IMES daquela época era muito pequeno. Nós éramos por volta de 60 professores, em determinada época. Isso fazia com que fôssemos muito unidos, e a escola realmente se caracterizava como um centro de conhecimento pessoal, um centro de socialização entre as pessoas, a sala dos professores era uma alegria total porque havia sempre gente que discutia, durante os intervalos, política, futebol, enfim, assuntos do dia-a-dia, o que transformava o corpo docente, isso o corpo técnico também acompanhava, transformava em um grupo de amigos, um grupo de pessoas que tinham um relacionamento social e um relacionamento inclusive afetivo entre as pessoas. Hoje é diferente, obviamente, você tem um corpo docente muito grande, e essa extensão dilui esses laços. Mas, aquela época, isso era marcante para todos nós. Vivíamos em um ambiente realmente de relacionamentos social e afetivo.
Pergunta:
Você falou desses dois momentos, do comecinho da universidade e de hoje, e eu queria que o senhor falasse um pouquinho dessa trajetória que o senhor acompanhou. Quais foram as mudanças que o senhor foi acompanhando na universidade nesse período?
Resposta:
As mudanças daquela época para cá foram significativas. Claro, a instituição cresceu, passou para centro universitário e depois para universidade e nós tivemos a felicidade aqui na universidade de termos... sempre dirigentes que estavam sempre preocupados com a instituição, que sempre estavam preocupados com os princípios que norteiam a instituição e que fizeram essa instituição [15']. Todos os nossos diretores e, depois, os nossos reitores, tiveram uma conduta que permitiu que o crescimento da instituição, sem abandonar em nenhum momento os princípios que nortearam a fundação da instituição e os princípios que ainda são aqui instituídos. Essa trajetória, eu digo que ela foi facilitada por essa felicidade que tivemos na condução da instituição. Não houve durante todo esse período de 40 anos que eu estou aqui, 42 anos, não houve momentos de ruptura que justificassem alguma forma de atividade ou atitude que viesse conturbar a instituição. Lógico que o consenso nem sempre existiu, lógico que houve dissenso em muitas oportunidades, mas, de uma forma geral, mesmo esse dissenso contribuiu para se aperfeiçoar, e eu acredito que isso tenha decorrido dessa felicidade que sempre tivemos de estar com diligentes que assumiram uma postura de defesa da instituição, independentemente da época e da formação deles, porque foram formações diferenciadas.
Pergunta:
Fale um pouquinho sobre a Coordenadoria de Apoio às Instituições Públicas.
Resposta:
A universidade, na época, Instituto Municipal de Ensino Superior de São Caetano do Sul, IMES, pela sua característica e pela diversidade do seu corpo docente, o IMES tinha sido sempre... tinha sido solicitado, havia solicitação de apoio a algumas prefeituras, que seja na gestão, programas, na área de educação, na área de gerenciamento, e também na área de pesquisa, que já havia o instituto de pesquisa do IMES, o INPES e aí, em uma certa oportunidade... a primeira prefeitura que demandou um trabalho através de um contrato, que seria um concurso público, foi a prefeitura de Mauá, em 1990, dois ano depois da constituição... dois anos depois da promulgação da constituição que obrigava a realização dos concursos públicos. Eu tinha sido, até então, diretor da Secretaria de Cultura do Estado na área de RH e tinha feito, na Secretaria de Cultura do Estado, um trabalho de seleção, um trabalho inclusive de concurso. Com a demanda da prefeitura de Mauá, que foi em 1990, essa demanda chegou até o diretor da época, que era o professor Moacyr Rodrigues e ele, sabendo disso, da minha atividade na Secretaria de Cultura, me chamou e falou: ‘olhe, tem uma demanda desse tipo, gostaria de saber se você pode assumir essa responsabilidade'. Nós assumimos a responsabilidade e foi criada então, nessa época, a Coordenadoria de Apoio à Instituições Públicas, que é um trabalho suplementar da universidade, e tem trazido para a universidade duas coisas muito importantes. A primeira é de caráter institucional. O IMES passou a ser conhecido na época nacionalmente, porque esses trabalhos se deram em nível nacional, e também, esse trabalho resultou no fortalecimento das receitas da universidade, o que vem acontecendo até agora [20'], em decorrência desses contratos. Com a formação da Coordenadoria de Apoio às Instituições Públicas, naquela época, nós fomos nos estruturando para que tivéssemos condições de realizar esses trabalhos que eram demandados pelas prefeituras, por governos de estado e inclusive pela federação. Mas com uma... com um direcionamento diferente porque, ou faríamos uma estrutura própria para a coordenadoria, e isso seria oneroso para a universidade porque não é toda hora que você tem uma demanda de concursos públicos, de certificação de competência, de estrutura organizacional, de capacitação, essas demandas variam muito, às vezes você tem um número grande, às vezes você não tem nenhuma demanda específica. Para você manter uma estrutura, seria oneroso quando você não tivesse essa demanda, e aí a universidade teria que arcar. Então, nós optamos por fazer um grupo muito pequeno dentro da coordenadoria e fazer parcerias, fizemos parceria com a UNESP, temos parceria com a UNESP, com a Universidade de São Paulo, e com outras entidades para que nós tenhamos, dentro dessas parcerias, condições de atender esses projetos, de planejar e realizar esses projetos. Essa coordenadoria foi cada vez mais, ao longo desse tempo, demandada para diversos setores, e temos feito trabalhos para instituições públicas, voltados geralmente para atividades de concursos públicos, processos seletivos, reforma ou reestruturação organizacional e, principalmente, também na área de educação, suporte na área de educação, fizemos para vários municípios. Como a universidade é uma autarquia, ela se insere perfeitamente no artigo 24 da lei nº 8666, que diz respeito à dispensa de licitação, o inciso 13, e a universidade é contratada diretamente com dispensa de licitação, para instituições de todos os níveis, Governo Federal, para dar dois exemplos, Universidade Federal do ABC com contrato atual, Universidade Federal de São Paulo, também no contrato atual. Governo, para dar exemplo, Governo de Estado, Secretaria da Saúde, Secretaria dos Transportes, através da EMTU e também fora do Estado de São Paulo, fizemos concursos públicos até para 15 Estados dentro dessa coordenadoria, e prefeituras inúmeras, de todo o Estado de São Paulo, fora do Estado, nós fizemos trabalhos, quer seja de concurso, quer seja de certificação de competências, mas mantemos ainda esse espírito da coordenadoria. A coordenadoria é uma estrutura muito pequena e ainda prevalece essa ideia de você ter parcerias, quando esses concursos, ou esses projetos, eles são demandados, o que significa que nós trabalhamos a custo mínimo, quase zero para a universidade, e trazemos os recursos, aumentando significativamente a receita da universidade, sem manter uma estrutura fixa grande [tosse do entrevistado - pausa curta para água].
Pergunta:
Professor, o senhor comentou sobre a sua passagem na Secretaria de Cultura do Estado, queria que você falasse um pouquinho dessa sua trajetória paralela à USCS. Então, você se formou pela USP, começou a dar aula aqui, como foi a sequência dessa trajetória? [25']
Resposta:
Bom, eu me formei pela universidade e fiz depois todo o meu caminho acadêmico dentro da USP, onde cheguei até o doutorado na ECA, na Escola de Comunicação e Artes. Paralelamente a isso, como eu tinha aulas aqui na Universidade de São Caetano à noite, eu assumi... eu já tinha um trabalho no Estado primeiro como sociólogo, logo depois da minha formação, nós fizemos um trabalho muito interessante no Vale do Ribeira [gagueja muito] hoje nós temos as demandas atuais e do povo nas ruas falando de educação. Naquela época, havia um conceito de que educação, obviamente como sempre houve, da importância da educação, obvio que não era novidade. Mas, nós tínhamos uma entidade no Estado que se chamava SUDELPA, que era a Superintendência do Desenvolvimento do Litoral Paulista e cabia a nós, técnicos, indicar os caminhos dos investimentos do Estado para principalmente tirar o Vale do Ribeira, uma região paupérrima da situação em que se encontrava, além de construção de estradas, iluminação, tudo mais, o enfoque que nós demos foi o enfoque na educação. O que nós propusemos, isso com ajuda de professores meus, da Universidade de São Paulo, que convidamos para nos assessorar na época, eu era técnico lá, e a área rural grassava o analfabetismo quase que total, e nós desenvolvemos um programa através de uma pesquisa que levou a um diagnóstico dessa área, inclusive circunscrevendo geograficamente, fizemos esse diagnóstico para apontar quais seriam as demandas locais em relação à educação, e constatou-se que a escola... primeiro, a escola era de péssima qualidade, quer seja em termos de estrutura física, era uma tapera geralmente, no meio do mato, quase que inacessível, os alunos não iam, o professor ganhando muito mal, e como nós tínhamos uma certa autonomia porque a SUDELPA nos apoiava nesse sentido, investimos na educação, primeiro construindo uma escola diferenciada, possibilitando que o professor morasse na escola, o que significava que esse professor teria que ter o comprometimento com a comunidade, e nós o capacitávamos para isso, através de aulas de cooperativismo, através de aulas de primeiros socorros, por exemplo, esse professor passava a ser o elo entre o estado e a população, porém a remuneração dele era em dobro, passou a ser em dobro, o que possibilitou que alguns professores, ou muitos, quisessem entrar no programa. Era difícil mesmo assim, embora ele passasse a ter uma escola decente, bem construída, com uma casa dentro da escola, casa mesmo, com toda a estrutura de uma casa. Isso foi feito no Vale do Ribeira durante uns dois anos provavelmente, mas infelizmente, isso era um fator de mudança. O professor passava a ser um polo importante da mobilidade social e um polo importante de apoio àquela comunidade que estava absolutamente abandonada. Como nós estávamos no meio de uma ditadura, esse programa foi tido como perigoso, a gente não via o porquê que seria perigoso, não se contestava absolutamente nada, o que se pretendia era educação [30'] e realmente era isso que era feito. Mas, em decorrência talvez dessa conotação, o programa foi abandonado, mas foi um trabalho muito bonito na minha carreira como sociólogo, paralelamente à minha atividade como professor na época no IMES. Posteriormente, depois dessa atividade, eu fui convidado para ser diretor da Secretaria da Cultura como diretor de Recursos Humanos. Aí, mera curiosidade. Nós encontramos, nós nos deparamos lá com uma situação muito ruim, orquestra sinfônica do Estado de São Paulo, que era gerida pela Secretaria da Cultura em péssimas condições, um grande regente, que era o professor Eliasar de Carvalho desesperado, porque os músicos ganhavam muito mal, não tinham nenhum comprometimento e coube, o secretário me chamou e coube a nós, do Centro de Recursos Humanos, refazer essa situação da Orquestra Sinfônica e também de outras atividades culturais do Estado, museus totalmente mal administrados, enfim, todos os problemas que você tem de uma administração pública quando você deixa a gestão sem o mínimo de cuidado, e principalmente sem o mínimo de cuidado profissional. Essa foi uma parte da trajetória, que eu fiquei cinco anos como diretor para desenvolver essas atividades, principalmente de apoio que a Secretaria da Cultura já mantinha. Os museus e principalmente a Orquestra Sinfônica do Estado. Depois disso, eu saí da Secretaria da Cultura e fiquei dois anos como diretor de uma cooperativa da USP, que chamava Cooper Cultura e depois eu me aposentei pelo Estado, mas continuei sempre com as aulas aqui na universidade, rapidamente eu acho que é isso. Tive uma oportunidade antes de fazer o estágio na Alemanha, quando eu estava ainda na Universidade de São Paulo, quando eu estava na pós-graduação do meu doutorado, fiz um estágio na Alemanha que foi muito interessante, que a Alemanha naquela época era dividida e também foi uma experiência muito boa, uma experiência não só de vida, mas também intelectualmente, foi importante.
Pergunta:
Quando o senhor assumiu a pró-reitora administrativa e financeira da universidade, queria que você falasse um pouco desse desafio, desse novo desafio, e também que falasse um pouquinho do olhar do sociólogo na área de Finanças, como essas duas áreas acabam dando uma ____.
Resposta:
Olha, o convite que o professor Bassi nos fez para assumir a pró-reitoria decorreu até de uns trabalhos que a gente vem fazendo aqui, principalmente na Coordenadoria de Apoio às Instituições Públicas, a CAIP, por quê? Porque a visão da nova gestão se diferencia um pouco na medida que, primeiro, obrigatoriamente, ela tem que se atualizar, não é possível que você tenha uma escola, uma universidade que tem uma faculdade de Administração, uma de Direito, e você ainda tem métodos de gestão que precisam ser alterados, que precisam ser atualizados. Como eu trabalhei muito, e continuo trabalhando em assessoria a municípios, a prefeituras, a minha experiência nessa área tem sido significativa e, de uma certa forma [35'] para a universidade, para nossos projetos, tem sido exitosa, haja vista que todos os que nos contratam, contratam uma segunda vez, uma terceira vez, uma quarta vez. Então talvez, por essa experiência, de visão, de modernização, uma visão mais próxima de um processo de atualização necessário à gestão pública, o professor Bassi nos convidou para assumir a pró-reitoria administrativa e financeira. Essa visão não é absolutamente distante da visão do sociólogo, primeiro porque você tem... eu tenho uma formação como sociólogo, mas eu também fiz um curso de Administração, me formei em Administração no Mackenzie e essa visão do sociólogo, entretanto, ela é extremamente importante para o administrador na medida em que você, primeiro, sabe dos limites de uma gestão administrativa e financeira, nós somos, dentro da pró-reitoria administrativa e financeira, uma atividade meio, atividade fim é uma atividade da docência, atividade de formação, e atividade de projetos, de implementação de projetos de extensão, ou de projetos de apoio, como faz a coordenadoria. Então, essa visão do sociólogo permite que você reúna as duas coisas, você não é tão tecnocrata, ou não deve ser tão tecnocrata como um pró-reitor administrativo e financeiro que o iniba em ver a circunstância em que você se inscreve. Por exemplo, nós temos algumas situações que merecem reparo aqui na universidade, e que estamos trabalhando para isso. A situação do nosso corpo técnico, do nosso corpo operacional, e eu não falo isso apenas em relação a salários, eu falo isso em relação a uma cultura organizacional que precisa estar sendo adequada a novas demandas, a novas situações. Talvez a visão do sociólogo compreenda isso. Isso me facilita um pouco, não sei se passa a ser uma presunção, mas me facilita um pouco para encaminhar junto com o reitor as demandas dentro de uma visão um pouco mais abrangente do que simplesmente burocrática. Eu acho que a pró-reitoria administrativa e financeira, se ela se circunscrever exclusivamente a uma atuação administrativa e financeira, ela corre o risco de ser somente burocrática ao invés, daquilo que nós imaginamos que deva ser, e nisso a gente tem o apoio do professor Bassi como reitor, um instrumento de alavancagem da mudança cultural, ou da mudança de cultura organizacional que a universidade tem que ter, haja vista a necessidade de acompanhar a situação atual, de acompanhar e de projetar para o futuro novas estruturas que suportarão o desenvolvimento, se não, você tem uma universidade, uma instituição que pode sofrer se ela não evoluir, como toda instituição. Se não evolui... então essa visão sociológica, eu acho imprescindível, independentemente de quem seja o pró-reitor, eu acho que é imprescindível para que essa pró-reitoria se transforme em uma alavanca de mudança para atingir os objetivos que desejamos, e não um obstáculo. Se ela for simplesmente burocrática, ela corre o risco de ser um obstáculo e não uma alavanca de mudança [corte na gravação].
Pergunta:
O que a USCS significa na sua vida? [40']
Resposta:
A USCS tem um significado especialíssimo na minha vida [pausa longa]. A USCS tem um significado fundamental na minha vida, primeiro pela identificação que eu tive logo que eu cheguei aqui, uma identificação com os valores, e quando eu cheguei aqui eu ainda, muito provavelmente com vinte e poucos anos, eu estava em um processo de internalização de valores, e a USP me passou valores que complementaram àqueles que eu já tinha vivenciado na minha infância, na minha juventude, valores que simbolizavam princípios muito importantes para o modo de vida, para as pessoas de uma forma geral. Quando você se identifica com os valores, quando você percebe que você está aprendendo pela internalização desses valores, você passa a ter um relacionamento com a instituição que é reforçado a todo instante e que você, saindo do racional, passa para o emocional, passa a gostar daquilo que você faz, você passa a gostar aquilo que você vivencia, você passa a gostar do ambiente em que você vive. Então, quer seja profissionalmente, quer seja socialmente e mesmo culturalmente, culturalmente eu me refiro a valores, a USCS para mim foi fundamental, não é à toa... você só fica em um ambiente 42 anos se, no mínimo, você tiver alegria de estar aqui, e é isso que eu sinto. Eu tenho alegria de vim para cá, eu fico com muita satisfação de fazer o que eu faço, muita satisfação em ter compartilhado com todos os que fazem parte da universidade, compartilhado momentos maravilhosos e principalmente de ter, como todos, e isso é divisível por todos efetivamente, mas um pouquinho talvez com a sorte que tivemos com as direções, os dirigentes nossos, essa alegria de ter compartilhado com o crescimento da instituição. Você vê que, em 42 anos, essa instituição cresceu em todos os sentidos, que seja fisicamente, mas principalmente em termos de ser considerada uma instituição nacionalmente respeitada, talvez internacionalmente reconhecida e respeitada e, fazer parte disso, certamente é uma alegria. Então, eu me sinto muito feliz de ter compartilhado com todo esse processo nesses 42 anos que aqui estou. [pausa para reposição de água ao entrevistado]
Pergunta:
A gente já está chegando ao final professor, mas o senhor falou desses momentos com 42 anos, acredito que deva ter uma série de momentos marcantes, gostaria de saber se o senhor poderia destacar alguma aula, alguma passagem, algo que ficou na sua memória dessa trajetória sua aqui na USCS. Creio que a pergunta é difícil porque são muito momentos...
Resposta:
É...
Pergunta:
Pode ser alguma coisinha da sala dos professores, desse ambiente.
Resposta:
Deixa eu pensar um pouquinho o que me aflora [pausa longa]. Olha... o que é importante eu acho, é o seguinte, do ponto de vista de alguma coisa que vem logo à mente. Uma instituição cresce, as pessoas crescem, no sentido mais amplo da palavra [45'] quando há um processo eventual de crise, ou um processo de ruptura, ou um processo de dificuldade, e isso que me vêm à mente aqui na universidade. Nós tivemos, na Coordenadoria de Apoio à Instituições Públicas, na CAIP, um momento difícil, um momento em que independentemente da nossa vontade, nós tivemos um problema relativamente sério em um dos concursos que nós fizemos. Não havia uma razão que levasse a esse problema, uma razão de ordem ética, nada que levasse... houve um problema operacional, e houve uma contestação de nosso cliente em relação à esse problema operacional em relação a um concurso que fizemos. Foi um ponto de inflexão da curva, porque o problema passou a ser institucional. Ou superávamos o problema, ou desistíamos de fazer aquilo que tínhamos feito até então, que são os projetos de assessoria, de consultoria, de capacitação e de concursos, principalmente. Nesse momento, chegamos para a direção, na época o professor Marco Antonio, expusemos a situação: ‘a situação é essa, existe uma interpretação que é do nosso cliente da mídia, que não é real, não é que não seja real, o problema existe, porém nós precisamos superá-lo ou arrefecer'. Esse momento foi crucial, porque naquela época a instituição, o IMES, fechou absolutamente conosco no sentido de nos apoiar e falar: ‘não, é um trabalho que leva o nome do IMES', então o IMES, pela sua diretoria, por todos que compartilhavam a direção, especialmente naquela época o professor Marco Antonio, nos deu total e integral apoio para que resolvêssemos o problema. Esse problema demandou um período de dois anos para que ele fosse efetivamente esclarecido e que nos isentasse de responsabilidade, a responsabilidade não foi nossa, de um problema que ocorreu em um concurso. Nunca tivemos um concurso anulado, mas quando tivemos um problema mais sério, isso foi crucial, o apoio do IMES na época, o apoio da instituição através, principalmente, da sua direção, do professor Marco Antonio, esse problema foi debelado e nós conseguimos superar e crescemos a partir daí. Tivemos a humildade de aprender com o que aconteceu, tivemos a humildade de revisar procedimentos e, a partir daí, nós deslanchamos, crescemos e hoje, felizmente, somos extremamente respeitados aquilo que nós fazemos, porém, sem perder essa característica de que, se não ficarmos atentos, ou se imaginarmos que sabermos fazer, o risco é muito grande, você tem que estar sempre revendo tudo isso. Então, eu cito essa situação que decorreu de um problema sério que nós vivenciamos que somente uma universidade atual, ou uma instituição, o IMES, como era na época com essa cultura de entreajuda [50'], essa cultura de companheirismo, mas companheirismo profissional, de trabalho de equipe, somente uma cultura desse tipo é que você teria um problema encaminhado dessa maneira. Eu me lembro desse ponto porque, primeiro que ele foi crucial no desenvolvimento dos nossos trabalhos e principalmente porque, até hoje nós nos pautamos por isso. Se não tivesse ocorrido isso, talvez lá na frente, nós tivéssemos feito um erro pior ainda, ou um erro por descuido ou alguma coisa que não nos tivesse chamado a atenção e, nesse momento, nós tivemos o apoio integral da instituição para que superássemos o problema que acreditou efetivamente em nosso trabalho, e felizmente deu certo, vem dando certo. É um processo, sempre é um processo, nunca você fala que está dando certo e vai sempre... é um processo que, felizmente, está indo bem.
Pergunta:
O senhor falou do início da sua participação no _____ estudantil como sociólogo, é possível traçar um paralelo entre aquele jovem e as manifestações dos anos 1960, a USCS inicia sua trajetória em 1968, com o atual jovem e as atuais manifestações que pipocaram por aí?
Resposta:
Eu acho, talvez pela legitimidade das manifestações atuais, talvez se pretenda traçar um paralelo. Só que, naquela circunstância, nós éramos, na verdade... essa consciência crítica vem muito depois. Nós éramos, na verdade, teleguiados. Na verdade, éramos jovens, queríamos mudar o país, mas sem uma consciência crítica que hoje existe, talvez pela facilidade até de comunicação. Nós tínhamos a consciência crítica, era sempre canalizada para uma determinada postura política e, principalmente ideológica. Então, ou você era de esquerda, mas dentro da esquerda havia centenas de formas de você atuar. Então, se compararmos aquela situação com a de hoje, eu prefiro a de hoje, certamente, porque, infelizmente naquela época, as palavras de ordem eram vindas nem sabemos de onde vinham, ou pelo menos desconfiávamos de onde vinham, mas éramos basicamente induzidos a acreditar em posturas ideológicas que absolutamente não condiziam com a realidade, mas soubemos disso depois de 1988, depois da queda do Muro de Berlim, antes disso, nós éramos sonhadores, achávamos que iríamos mudar o mundo, porque o mundo tinha que ser mudado, mas dentro daquela ideologia, o que é um erro absurdo, e muita gente pagou muito caro por isso. Eu tive amigos que desapareceram, tive colegas de trabalho daquele trabalho da SUDELPA que nós fazíamos no Vale do Ribeira, existia uma ação do Exército que se chamava ACISO na época, mas tive amigos que desapareceram na minha frente, que foram pegos na minha área de trabalho. Então, hoje é possível você ver retroativamente e fazer uma crítica disso, mas na verdade éramos ingenuamente levados por diretivas ideológicas que não condiziam com a nossa realidade, mas isso você só vai perceber depois. Naquele momento se achava... então hoje não, hoje eu acho que esses movimentos que parecem ser difusos nas suas reivindicações são, além de ilegítimos, totalmente ilegítimos, eles têm uma consciência que está... acompanhando essa movimentação, e não através de uma palavra teleguiada, não através de uma palavra de ordem [55'], não através de uma ideologia que está absolutamente superada. Então eu acredito que essa comparação serve até mais como lição do que foi antes. Muito mais legítimo hoje do que aquele que era um movimento, aqueles movimentos estudantis dos quais eu participei, mas que você não sabia muito bem por que você estava lá, mas se imaginava, você sonhava, você tinha meia dúzia de palavras, tinha lido alguma coisa. Era até interessante, as leituras poderiam até ser interessantes, mas na verdade era uma realidade vista sob uma ótica ideológica que não condizia com a realidade, haja vista o que aconteceu no mundo depois, especialmente em 1988, com a pulverização da União Soviética.
Pergunta:
Professor, algo mais que o senhor gostaria de deixar registrado?
Resposta:
Não, acho que basicamente é isso. Não sei se teria... mas não, acho que não. Acho que basicamente é isso.
Pergunta:
Então queremos agradecer imensamente a contribuição do senhor e paciência conosco.
Resposta:
Eu que agradeço.
Lista de siglas
IMES: Instituto Municipal de Ensino Superior de São Caetano do Sul
USCS: Universidade Municipal de São Caetano do Sul
USP: Universidade de São Paulo
INPES: Instituto de Pesquisa da USCS
RH: Recursos Humanos
UNESP: Universidade Estadual Paulista
EMTU: Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de São Paulo
USP: Universidade de São Paulo
ECA: Escola de Comunicações e Artes
SUDELPA, que era a Superintendência do Desenvolvimento do Litoral Paulista
CAIP: Coordenadoria de Apoio às Instituições Públicas
ACISO: Ação Cívico Social